quarta-feira, 29 de junho de 2011

'15 filmes da minha vida' - Nº4 - Buffalo 66 (1998)


O amor vence todos os obstáculos. O amor torna o silêncio em palavra, transforma o frio em calor e abre caminhos onde só havia muros. Em Buffalo 66, Vicent Gallo cria e representa uma personagem que vai passar pela experiência de uma vida.
Billy Brown (Vicent Gallo) é um homem com noção de pragmatismo suficiente para perceber que a vida não lhe irá dar muito mais do que tem. Billy é um ex-condenado que acabou de sair da prisão. No dia da libertação, dá inicio a um plano em que está determinado a exercer vingança sobre o culpado da sua apreensão. Billy Brown vive obcecado com esta ideia e com uma outra: a de continuar a dar uma imagem aos seus próprios pais de que é um homem muito bem sucedido. Com a honra por vingar e uma imagem de bom filho a salvaguardar, há no entanto que satisfazer em primeiro lugar uma necessidade: ir à casa de banho. Nos primeiros minutos do filme, Billy vive torturado com este simples imperativo da natureza, o que transforma toda a cena do rapto de uma bailarina, em algo cómico e peculiar. O ex-condenado é neste momento um homem dominado por uma necessidade fisiológica e pela necessidade de arranjar uma “esposa de aluguer”. Esse alguém é Layla (Christina Ricci), talvez um pouco mais nova do que Billy e que este resgata de uma aula de dança para ser a sua mulher. Pelo menos durante a curta visita que ele deverá fazer aos seus pais em Buffalo, Billy quer dar a entender que é bem casado, que tem um emprego estável e que a sua vida é uma tremenda felicidade. Começa então a cena na casa dos pais.
Todos nós somos muito mais do que aparentamos, temos mais fragilidades do que aquelas que tentamos esconder quando nos relacionamos com os outros e somos muito mais especiais do que aquilo que tentamos, muitas vezes em vão, fazer passar. É um mundo de aparências carregado de um ar de complexo vazio emocional, que se respira na casa dos Brown. Juntamente com Layla, Billy vai despender tempo na casa dos seus pais, a tentar colar peças com cuspo e a procurar memórias antigas. Layla é o elemento novo que ambos os progenitores de Billy, Jimmy (Ben Gazzara) e Jan Brown (Anjelica Huston), adulam de forma quase imediata. Ao filho, cabe-lhe o papel secundário, o que parece ter tido sempre na história daquela casa.
E eis que Billy Brown é agora um homem ex-condenado, desejoso de se vingar e… com um grande dilema. Fragilizado com a cena familiar, Billy depara-se com Layla, que ainda lá está. A sua representação foi óptima junto dos seus pais. Mas agora cada um deles deverá seguir o seu caminho. Na estrada, na cidade e à noite eles são invadidos pelo frio. Layla é a doçura, Billy, a pedra fria. Ali perto, na rua, um cartaz publicitário faz uso de uma frase que diz mais ou menos isto: “Partilhe a sua vida. Partilhe a sua decisão”. Billy Brown contorce-se por dentro com dor. Ele debate-se com os seus demónios e sente-se deprimido. Layla vê o melhor daquele homem e está atraída pela sua sensibilidade, que lateja por debaixo de uma capa escura. O filme segue o seu curso e as próximas cenas são passadas num quarto de hotel, onde Billy e Layla se aproximam e se afastam, à procura de uma intimidade que tanto procuram.
Buffalo 66 é um filme onde não existe fogo de artifício e onde não existem perseguições de carros ou aviões. O grande acontecimento é silencioso, não surge de um PAH! Surge antes da subtileza, da doçura e da sensibilidade que se anunciam e que vão derrubando barreiras. Os soberbos Yes compõem a história e dão voz aos sentimentos. As músicas da banda inglesa escolhidas por Vicent Gallo (que também compõe assina boas músicas para o filme) são ‘Sweetness’ e ‘Heart of Sunrise’. Termino com um excerto de ‘Sweetness’, algo que Billy Brown poderia dizer na parte final da sua história: ‘Ela transmite a doçura – Ela sabe muito bem o que dizer para me fazer tão bem por dentro – e quando eu estou sozinho e sinto que já não tenho que me esconder.’